Prática
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Marketing da Produção Cultural

 (1999, segundo semestre)


Manoel Marcondes Machado Neto


Precisamos inaugurar um novo momento, para que não mais se improvisem “assessores” de divulgação, “formatadores” de projetos e “captadores” de recursos.

Enquanto houver empresas que só apóiam eventos culturais se a custo zero, agências de propaganda torpedeando os projetos culturais pelo que eles representam em termos de “perda de mídia” na verba do anunciante, enquanto tivermos empresários que perguntam: - mas o que é que eu vou ganhar com isso ? diante de uma proposta de patrocínio, ou: - quem é a atriz global no elenco ? diante de uma proposta de montagem teatral em busca de apoio, enquanto houver veículos de comunicação que se referem ao “festival de jazz que está acontecendo no MAM”, omitindo o nome dos patrocinadores, será realmente difícil pugnar pelo chamado marketing cultural.

Não é somente a indigência cultural de alguns daqueles que ironicamente têm a capacidade financeira para posar de “mecenas” que nos preocupa. O que mais chama a atenção é a necessidade urgente de profissionalizar as áreas de produção, divulgação e captação de recursos nesse segmento que é dos poucos em franca expansão de atividade e de emprego: o marketing da produção cultural.


Não está claro ainda se tudo aquilo que se rotula como marketing cultural de fato o é. Há, porém, uma certeza: quanto melhor for o nível daqueles que se lançam a criar parcerias entre empresas/contribuintes e artes/manifestações culturais, melhor e maior será a produção - o que contribuirá para a elevação do status cultural de toda a sociedade.

Não se trata de criar proteções e reservas de mercado profissionais, sindicatos ou associações de classe, mas sim de promover a formação de perfis para trabalhar nessa atividade tão específica, tão complexa e tão delicada que é tratar do artista e de sua obra, falando, ao mesmo tempo, a linguagem dos burocratas, dos “marketeiros”’, dos técnicos de artes e espetáculos e dos controllers, que nos pedem tudo na ponta do lápis. É muita coisa para se saber, enfim, para aprender. Já não há espaço para improvisar, para “dar uma força” - ou se faz direito ou, simplesmente, não acontece.


Precisamos, também, desatar o nó da distribuição dos bens culturais no Brasil.

Enquanto isso não vem, continuamos nos deparando com repórteres que perguntam “no ar” se Rodin virá para o lançamento de sua exposição, músicos que tocam em bingos em troca do prato de comida e drinks, casas de cultura vazias cujos folhetos de divulgação (caríssimos, em papel couché) mofam em cima do armário, incensados artistas plásticos que ganham a mídia porque pintam telas que combinam com o sofá, absurdos como o show do U2 no Rio de Janeiro, editores de difícil acesso que, procurados, retrucam: - mas o senhor é o famoso quem ?, revistas jabá de cultura, universidades com mais copiadoras que bibliotecas, violações graves dos mais elementares direitos de autoria, superproduções dirigidas ao povão distribuindo ingressos em sofisticadas casas de café.

Saudades do tempo em que os sindicatos de artistas defendiam quem “gramava” por quatro anos nos cursos de artes cênicas. Hoje, modelos pululam e a “entidade” ganha crédito no final da novela. Tínhamos uma legislação efetiva no município do Rio de Janeiro; agora encontramo-nos - de novo - com o pires na mão. Bajulamos os políticos da hora ou engolimos o eterno discurso da falta de verbas para a cultura. Damos recibos “por fora” ou: - infelizmente, talvez no ano que vem . . .


Basta da cultura do favor ! Precisamos inaugurar um novo momento nesse campo: o do profissionalismo. Para que não mais se improvisem “assessores” de divulgação, “formatadores” de projetos, “captadores de recursos” e nem que se precise sentar dois ministros do mesmo governo à mesa para assinarem um convênio de cooperação entre turismo e cultura. A propósito: o que mudou ?

Quando produtores, artistas, agências de propaganda e empresas patrocinadoras contratarem gente que entende de aliar estratégias de marketing com arte e cultura é que absurdos como os citados ocorrerão menos e segmentos hoje sem voz, artistas sem público, peças sem platéia, orquestras sem salários, corpos de baile sem patronos, patrocinadores sem retorno, platéias sem educação e centros culturais sem verbas poderão mudar e fazer florescer esse imenso solo fértil que é a criação cultural brasileira.

Talvez então, sendo um dos maiores produtores de música e discos do mundo, saiamos do nosso insignificante nem 1% de PIB cultural.



Manoel Marcondes Machado Neto

Professor da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Graduado em Relações Públicas (IPCS/UERJ), Mestre em Comunicação (ECO/UFRJ) e Doutor em Ciências da Comunicação (ECA/USP). Atua como produtor cultural e consultor de empresas desde 1980. Criador do Curso "Marketing Cultural Teoria & Prática" do CEPUERJ.

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